sábado, 9 de junho de 2018

O assembleiano participa das atividades culturais (mundana)? (Parte 1)

Portanto, quer comais quer bebais, ou façais outra qualquer coisa, fazei tudo para glória de Deus. - 1 Coríntios 10:31.
(Está é uma opinião pessoal em que não possui chancela denominacional).

Ouvir música que não é da igreja (dita mundana por uns, ou secular por outros), assistir novela, fazer o perfil e interagir em redes sociais, jogar futebol, participar/eleito a cargos eletivos e/ou políticos, fazer faculdade, ler romances e temas políticos, participar de coletivos sociais (feminismo, ou pró-vida), entre tantas coisas são cotidianas.


Essa pergunta é bastante capciosa pois faz uma diferença tácita entre o que é denominado mundano. Isso levanta duas dicotomias: a) mundano e santos; b) cultura mundana e cultura cristã.


Ante eu preciso informa que acredito que vivemos num período ímpar da história no qual as comunidades não vivem isoladas territorialmente e culturalmente como antes, mas temos nos unido por meio da tecnologia de comunicação ocidental, meios de transportes e o mercado (economia). Logo, a interação cultural hoje é muito mais real, contingente e inevitável hoje nos contextos urbanos e/ou contexto interligados seja pelo mercado (capitalismo), seja pelas relações culturais e/ou interesses missionários.


Logo, creio que a dicotomia inicialmente pronunciada pode ser em primeiro nível é cultural e depois suas práticas, ou seja, frutos ou expressões da cultura. Não há uma prática que não tenha uma crença, explícita ou implícita, no qual seja organizada por formas de pensamentos que utilizem símbolos, e sejam comunicados e/ou reproduzidas por grupo no qual faz sentindo essas práticas e significados. Por exemplo, o ato de entoar na congregação o hino da harpa nº 70, Porque Ele vive (primeira estrofe):


“Deus enviou, Seu Filho amado, Para morrer, em meu lugar, Na cruz morreu por meus pecados, Mas ressurgiu, E vivo com o Pai está”


O ato de entoar o hino é uma expressão de reconhecimento da ação de Deus, feito inicialmente em grupo em reunião (como o culto), inspirado nas Escrituras (mensagem, uso das palavras com sentido particular: Filho, cruz, ressurgiu, Pai), utilizado por irmãos participantes do movimento pentecostal (Assembleia de Deus).



Todavia, poderia se dizer que é uma cultura cristã, mas há elementos mais gerais que essas características estão incluídas. Por exemplo: usamos a língua portuguesa, a reunião ocorre com liberdade de culto e reunião, utilizando-se de recursos físicos e sociais. Então, a ideia de cultura pode ser incerta, ou inexato.


Neste sentido, a cultura pode ser visto de forma mais ampla. Consultando o pesquisador francês Edgar Morin, entende a cultura pode ser entendido como cultura no sentido de tradição clássica (religiosa ou humanista), há também a cultura específica de uma nação, e por fim há o que é entendida por cultura de grupo particular. Desta forma, uma possível compreensão poderia ser:


“A cultura constitui um complexo de normas, símbolos, mitos e imagens que penetram o indivíduo em sua intimidade, estruturam os instintos, orientam as emoções [...] realizam trocas mentais de projeção [...] personalidades míticas ou reais que encarnavam os valores [...] Uma cultura fornece ponto de apoio imaginários à vida prática, pontos de apoio práticos à vida imaginária; ela alimenta o ser semi-real, semi-imaginário, que cada um secreta no interior de si (sua alma), o ser semi-real, semi-imaginário que cada um secreta no exterior de si e no qual se envolve (sua personalidade)” (MORIN, 2009, p. 15).



Nesse sentido, as práticas do “mundo cristão” ou nessa ideia, na cultura ocidental poderia ser uma subcultura cristã. De toda forma, no encontro com outras crenças e práticas no bojo da vida ordinária as práticas e vida cristã é algo singular entre tantas, e que a Bíblia ordena a postura de santidade (1 Pe 1.16), ou lembra da história “O Peregrino” de John Bunyan, na caminhada para nova terra e a entrada pela porta estreita. É irônico que nesse conto infantil que segundo Pimentel (2012) os personagens “Obstinado, Flexível, o Pântano da Desconfiança, e o Sr. Sábio-segundo-o-mundo, tudo foi obstáculo na jornada do Cristão pela Porta Estreita”. Assim, não há uma fórmula mágica para pensar santidade, cultura e vida cristã.


Me chama atenção que o pastor Franklin Ferreira (2013) comentando sobre o trabalho de Niebuhr (1967) com o título “Cristo e a Cultura”, sendo que substitui a metáfora Cristo como sinônimo da igreja e das ações enquanto grupo social e material no mundo, por Cristão. Nesse sentido fica mais situado e personificado pessoalmente, mas a ideia de Cultura é quase que substancial e homogênea, diferente do que Morin propõe, mais válida para o propósito de comparação.




Para sintetizar a ideia de Niebuhr (1967) com Ferreira (2013) e  Alves (2016) para inserir as perspectivas abaixo. Mas é importante que para uma perspectiva ser bíblica, necessita contemplar o princípio de criação-queda-redenção divina em proporções admissíveis. (OBS: Parece mais acadêmico o discurso, mas é importante para ter parâmetro histórico).
a) o cristão contra a cultura - a lealdade e autoridade sobre o cristão seria exclusivamente a Cristo e a irmandade, e se criam estruturas alternativas para servir a Deus, e se impõe a definitiva recusa a qualquer aspecto cultural contraditório a interpretação bíblica ou institucional. Apresentando como portadores históricos dessa perspectiva no Didaquê, na Primeira Epístola de Clemente, e nos escritos de Tertuliano (c.160–c.225) e dos anabatistas do século XVI, como Michael Sattler (c.1490–1527). No Brasil é próprio de muitas congregações pequenas e independentes com teor separatista e fundamentalista evangélica. Sendo assim, aparentemente, há pouca perspectiva de redenção, ou a redenção somente para o futuro escatológico (na interpretação que põe que quando Jesus vier, depois do arrebatamento, no novo céu e nova terra, por exemplo).
b) o cristão na cultura - o cristão ver Cristo na sociedade e nas suas estruturas, não sendo dicotômico, pelo contrário, toda expressão é digna de absorção/assimilação. O Messias é visto como compatível para realização de suas aspirações, sonhos e esperanças. Aqui é compatível com os ensinos de gnósticos do século III, Abelardo de Paris (1079–1142) e dos teólogos liberais do século XIX refletem esta posição e também a igreja evangélica na Alemanha, por influência deste entendimento, trocou seu nome para Igreja do Reich e seus pregadores juraram obediência a Hitler, e a igreja americana estadunidense depois da independência. Um exemplo brasileiro seria a IURDI (Igreja Universal) no qual interage e assimila em todas as esferas do plano político, econômico e espiritual. Aqui parece que a queda do homem quase não tem impacto na vida e na cultura, por isso necessita de cuidado quem apoia essa perspectiva.
c) o cristão acima da cultura - entende o mandato cultural de Deus na criação, logo a cultura não é boa e nem ruim. A cultura é sustentada por Deus, e veem a harmonia (ou uma síntese) entre o cristão e a cultura como a melhor maneira de abordar o “problema”. Pode ser observada em Clemente de Alexandria (c.150–c.215) e Tomás de Aquino (1225–1274), que busca uma unidade entre o cristão e a cultura, onde toda a sociedade aparece hierarquizada. Logo, a igreja e sua mensagem institucionalizada condiciona culturalmente a sociedade. É nisso que Padilha (2016) diz que a América Latina é um continente batizado e não convertido. Por outro lado, há uma busca de influenciar o discurso secular por uma cosmovisão superior, um exemplo é o calvinismo da Mackenzie. Aparentemente a posição da criação é autônoma ao efeito da queda, e assim a cultura também, desta forma o esforço é de dominar a cultura.
d) o cristão e a cultura em paradoxo - nessa perspectiva há “dois reinos”, a igreja e a cultura, no qual o cristão é fiel ao Senhor e possui responsabilidade pela cultura. Logo, entra em paradoxo, pois há situações que a cultura está refletindo o pecado do homem que faz possui responsabilidade, mas não concordância. Um exemplo é quando uma mulher (cristã) sofre espancamento do marido (cristão) e vem a questão de denunciar, ou não, a polícia. Posição associada a Martinho Lutero (1483-1546) e Søren Kierkegaard (1813-1855). Típico do discurso que diz não ter nada haver com o “mundo” mas aceita uma participação discreta na vida social e como cidadão. Alves (2016) apontam aos membros da Congregação Cristã no Brasil e da Igreja Cristã Maranata estariam nessa tipologia, embora beirando ao “Cristo contra a cultura”. A queda afetou a cultura e suas consequências serão resolvidas no futuro escatológico.
e) o cristão como agente transformador da cultura - a visão de redimir a cultura, em que os elementos de criação e queda são considerados, todavia, o Criador por meio dos eleitos levam a cultura “transformada a vida humana para a glória de Deus” através da graça de Deus. Posição associada a Agostinho (354-430), João Calvino (1509-1564), John Wesley (1703-1791) e Abraham Kuyper (1837-1920). No Brasil está presente no movimento de Missão Integral e movimentos sociais com ativismo cristão transformador. Se enfatiza muito a redenção e a queda é pouco enfatizado em comparação às outras perspectivas.
Os assembleianos não estão perfeitamente categorizados em nenhuma dessas perspectivas devido ao tamanho (mundial ao local) da instituição e ser uma instituição multifacetada. Apesar de acreditar que no Brasil muitos estão ainda na perspectiva original da Assembleia de Deus da década de 50, ou seja, o cristão contra a cultura, é facilmente percebida.

E continua ...
Obras Citadas
Alves. L. M. (2016). Niebuhr: Cristo e Cultura. Fonte: Ensaios e Notas: https://ensaiosenotas.com/2016/05/27/niebuhr-cristo-e-cultura/

DeYoung, K. (2012). The Three R's of Christian Engagement in the Culture War. Fonte: The Gospel Coalition (TGC): https://www.thegospelcoalition.org/blogs/kevin-deyoung/the-three-rs-of-christian-engagement-in-the-culture-war/

Ferreira, F. (2013). Franklin Ferreira - O Cristão e a Cultura. Fonte: Voltemos ao Evangelho: http://voltemosaoevangelho.com/blog/2013/02/franklin-ferreira-o-cristao-e-a-cultura/

Morin, E. (2009). Cultura de Massas no século XX: Neurose. Rio de Janeiro: Forense Universitária.

Niebuhr, H. (1967). Cristo e Cultura. ((Série encontro e diálogos Volume 3). Tradução de Jovelino P. Ramos., Ed.) Rio de Janeiro: Editora Paz e Terra.

Padilla, C. R. (2014). Missão Integral: o reino de Deus e a igreja. Viçosa: Editora Ultimato.


Pimentel, V. (2012). Os 3 Rs do Envolvimento do Cristão com a Cultura. Fonte: Voltemos ao Evangelho: http://voltemosaoevangelho.com/blog/2012/09/os-3-rs-do-envolvimento-do-cristao-com-a-cultura/

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